Dr Framar
Dr Francisco Maria Manso
O Dr Francisco Maria Manso, nasceu em Aldeia do Bispo aos 28 de Novembro de 1892 e faleceu no Sabugal aos 27 de Dezembro de 1982, está sepultado no cemitério de Aldeia do Bispo. Na sua campa podemos ler autoepitáfio deste homem de espírito tão sensível :
« Já cansada a minha alma desprendida
Vai ajoelhar humilde aos pés de Deus
Tantas lembranças do que fiz na vida
Tantas saudades dos queridos meus. »
O Dr. Manso, era poeta que imprimia ritmo e cadência à realidade poetizada. Sob o pseudônimo de Dr Framar, publicou na década dos 70 do século XX o livro : « Caçadas aos javalis » publicação da Casa Véritas na Guarda.É a descrição pormenorizada das campanhas de caça organizadas « pelo Chefe de Estado Maior » (Dr Manso)de 1923 até 1929.
« Eu canto a mocidade, a destreza, o dinamismo, a valentia ! »
Assim começa a descrição das campanhas de caça aos javalis na raia sabugalense por trilhos de Aldeia do Bispo, Fóios, Vale de Espinho, Quadrazais, etc. e por vezes de Villasrubias (já na vizinha Espanha).
Conta histórias inolvidáveis das campanhas aos javalis mais excepcionalmente aos veados e linces.
Além da paixão pela caça adorava os encerros das Capeias raianas nos quais sempre participava com um dos seus belíssimos cavalos.
Doutor em medicina formado na faculdade de Coimbra em 1918/1919, regressou para o Sabugal por volta de 1923.
Á minha Terra
Como é linda como é bela … a sonhar …
A tão saudosa terra em que eu nasci!
Como uma florzinha é sem par
Essa terra que leda me sorri!
Não t’amesquinhes … oh … deixa-te amar,
Terra minha em que lágrimas carpi!
Vês esta alma, que sabe só chorar,
Com saudades, saudades … oh … por ti?
Como és bonita, julgo-te deitada,
‘Inda sorrindo como namorada,
Entre a folhagem dum belo jardim!…
Oh!… Bela e saudosa da infância
Hoje de ti a tão longa distância …
Sê meu leito final da vida ao fim.
Casa de Aldeia do Bispo
Quando entro nestas casas – velho lar
Quando de longes terras volto aqui
Choro de saudade ao recordar
Tanto querer daquelas gentes que perdi.
Mortos queridos, tanto a lembrar
Menino em férias … sonho que vivi …
Num encanto de amor familiar,
Na adoração da casa onde nasci.
Enquanto tiver vida andais comigo
Nos lugares do meu lar antigo
Que visito a rezar com emoção
Meu Deus a dor era menos talvez
Se pudéssemos vê-los outra vez
E apertá-los contra o coração.
Caçada aos javalis
CAMPANHA PRIMEIRA
Eu canto a mocidade, a destreza, o dinamismo, a valentia! Por não existir a guerra, vamos contar as histórias inolvidáveis das campanhas aos javalis.
Tal como nas batalhas, disparam-se espingardas, sibilam balas, percorrem-se montanhas na perseguição do inimigo aguerrido que sabe defender-se e servir-se à maravilha das suas navalhas. Na preparação da primeira campanha ouvem-se caçadores, de barbas brancas, relatando ufanos a morte de veados na vizinha mata espanhola de Genestosa e caçadas a veados e javalis, na serra da Marvana. Tinham de vibrar, os nervos irrequietos, sedentos de aventuras! Alguns pastores apascentando gados nessas serranias, eram interrogados, em minúcia, sobre a existência, hábitos e locais onde viviam esses «catedráticos». Vinham as histórias dos cães de gado perseguindo javalis, com as inevitáveis eventrações. Destruição de searas, esperas feitas de espingarda aperrada em noites de luar, visando mal, ficando às vezes um fio de sangue a marcar a fuga do notívago. Sentia-me invadido por um entusiasmo de batalhas, como os primeiros guerreiros portugueses, a quem viessem anunciar a presença de moiros, a poucos quilómetros da fortaleza! Tomei conhecimento das dificuldades da organização das batidas. A Quinta do Major, distante cinco léguas dos primeiros povoados, num emaranhado de matos e de ravinas, de riachos e ondulações, não era fácil de caçar.
Como ponto possível para dormir apenas uma casa e um lagar de azeite, em plena selva. A casa tinha a recomendá-la o ter servido de esconderijo ao maior ladrão da raia espanhola, de nome «Montejo», que terminou na forca, na povoação espanhola de Valverde del Fresno. O lagar de azeite podia muito bem ter sido construído pelos avós de D. Afonso Henriques, se nesse tempo não estivessem por lá os moiros, ou a «Rosa da Montanha».
CAMPANHA SEGUNDA
A Ilustração Portuguesa de 12 de Maio de 1923 publicou, com duas fotografias, uma delas com quatro caçadores e um javali abatido, um pequeno artigo onde relatava: «Realizou-se nos dias II a 14 do mês findo, na Quinta do Major, limite de Vale de Espinho, urna grande batida aos javalis promovida pelo Dr. e na qual tomaram parte quarenta caçadores. Trata-se da maior caçada de que há memória no respectivo concelho, achando-se representadas pelas pessoas que tomaram parte nela as freguesias do Sabugal, Quadrazais, Aldeia da Bispo, Meimão e Vale de Espinho, tendo sido atribuido a cada uma dessas freguesias um dos animais abatidos, os quais foram em número de cinco, quatro fêmeas e um macho.
Tudo correu sem o mais pequeno incidente desagradável, tendo sido, os referidos caçadores recebidos com grandes manifestações festivas ao regressarem ao ponto de partida».
A caça é a guerra em tempo de paz! Não falta aos heróis a aclamação das multidões! Partimos para esta caçada já como vetarenos conhecedores da topografia do campo de batalha e da qualidade do inimigo. Os voluntários aumentaram e pelas fotografias ainda podemos dizer os nomes… alguns com que saudades, Luís Pinto, Juiz Almeida e Matos, o então Delegado Henrique Carneiro, o escrivão José Neves, o Dr. Carlos Frazão, Arnaldo Manso, Francisco Aires Pinto, irmãos Vieiras, António e Alexandre José Metelo da Nave, Prof. Robalo, Santos Pina, Tenente José Alexandre Lopes, Tenente Brito, José Augusto do Meimão, Joaquim Nabais, Manuel André… e outros que formavam o grosso da coluna como batedores.